Por que a esquerda odeia videogames

Porque a esquerda odeia videogames é um artigo de Mytheos Holt de 2015 que argumenta que os games mostram o lado sombrio da natureza humana, algo que alguns não querem acreditar que exista.


1 de julho de 2021

Por que a esquerda odeia videogames é a tradução de um artigo de autoria de Mytheos Holt publicado originalmente em 16 de junho de 2015 – pouco depois da exibição das imagens do Doom 2016 na E3 daquele ano – feita por Giovanni Russo.

Note que o artigo lida com um tipo específico de esquerda. Não quer dizer que todo esquerdista não gosta de videogame e que não exista direitista que também ataca os games (inclusive cita alguns destes). Também, não significa que concordemos com tudo que foi exposto.

O artigo basicamente argumenta que os games mostram o lado sombrio da natureza humana, algo que alguns militantes de esquerda não querem acreditar que exista. Achei interessante especialmente os elementos rousseaunianos que podem ser identificados neste assunto, e resolvi, meio a caráter de experiência, fazer a leitura do texto, que já havia sido nos enviado faz um bom tempo, no vídeo do canal da Gaming Room que vem a seguir:

Como fundo do vídeo, joguei uma partida de Doom II com os seguintes mods: Brutal Doom Monsters Only, Mechatron e Jenesis. Na próxima sessão, temos o texto completo e sem alterações. Resolvi publicá-lo aqui pro vídeo não ficar sem a referência, pois o site onde a tradução estava hospedada originalmente ficou offline.

Por que a esquerda odeia videogames

Vídeo games mostram o lado sombrio da natureza humana, algo que a Esquerda não quer acreditar que exista.

Esta semana houve a Electronic Entertainment Expo, indiscutivelmente a mais importante conferência relacionada a vídeo games que acontece anualmente. Como de costume, um enxame dos mais prolíficos parasitas da justiça social da Esquerda emergiram para atacar o evento.

O que causou um desconforto específico foi o excessivamente violento trailer para “Doom”, um remake com um gráfico avançado do clássico jogo de computador de 1993 que conta a história de um soldado forçado a lutar para escapar de uma base lunar reinada por literais legiões do Inferno, e eventualmente escapar do próprio Inferno. Mais do que como o “Doom” original – que, além de introduzir o conceito de níveis de jogos gerados por usuários, é quase certamente o jogo mais controverso na história – o trailer teve autonomeados guardiões morais com os cabelos em pé sobre a sua natureza hiperviolenta. De nota particular foram as respostas de Jonathan McIntosh e Anita Sarkeesian, co-criadores da infame e mal pesquisada série Tropes vs Women in Video Games, e do site Frequency Feminist.

Escrevendo pela conta do Twitter da Feminist Frequency, Sarkeesian queixou-se:

“Esse nível de violência extrema não deveria ser considerado normal. Isso não é uma desculpa para dizer que é esperado porque se trata de DOOM. Este é o problema.”

O comentarista de Internet PopeHat brincou ao dizer que o desacreditado Jack Thompshon, o cruzado da violência no vídeo game, deve ter roubado a senha do Twitter de Sarkeesian.

Foi uma comparação inadequada, porque a reclamação de Sarkeesian, como a de Thompson, não tem mérito. Além do mais, muita das detalhadas reclamações que McIntosh fomenta – tais como o trailer de “Doom” apresentar alguém sendo partido ao meio – sua falta de informação foi quase cômica. O mesmo ato é retratado na extremamente popular franquia de Xbox “Gears of War”, chegando até mesmo a mostrar a motosserra do mesmo ângulo que no trailer de “Doom”.

No entanto, mesmo que essa pérola tenha sido merecidamente zombada, está longe de ser o único caso de Sarkeesian e McIntosh se queixarem da violência em jogos de videogame em geral, e das mulheres em particular. Quase sempre o par ignora o contexto e a importância narrativa (um claro sinal de um possível censurador mascarando-se como um crítico da arte), mas o mais ataque recente pela Extrema Esquerda (da qual Sarkeesian e McIntosh são uma representação) a jogos levanta uma séria questão: O que há sobre a violência nos games que deixam essas pessoas tão irritadas?

Quando a Esquerda se torna a Direita Religiosa

Não é uma pergunta com uma resposta óbvia. Gerações anteriores de ativistas anti-violência que brotaram da Direita Religiosa, que viram jogos violento como uma forma de escândalo vendável, e uma apologia a violência em seu pior. A última acusação tem sido desacreditada, e mesmo que Sarkeesian faça uma tentativa risível de responsabilizar os jogos de videogame que tem violência contra as mulheres pela violência doméstica e sexual, você pode dizer que nem mesmo ela acredita nisso.

Deve haver uma boa razão para esquerdistas imitar um grupo que eles desprezam tanto como a Direita Religiosa, chegando ao ponto de se apropriar de partes de seu discursos, isso é algo de deixar qualquer um perplexo. O que, afinal de contas, está acontecendo?

Felizmente, estando a par dos escritos anteriores de Sarkeesian, e tendo um conhecimento prévio dos tweets dela e de McIntosh, podemos tecer uma explicação. Primeiro, uma amostra relevantes dos tweets em questão:

“Isso é algo realmente perturbador (e depressivo) que a audiência da EA Expo está entusiasticamente aplaudindo corpos sendo estirpados.

Essa merda é doente. Tem algo muito, muito seriamente errado com qualquer um comemorando o trailer de Doom.

Nós apenas vimos um auditório cheio de adultos comemorando ao ver corpos sendo cortados ao meio com uma motosserra. Apenas pensem sobre isso por um momento.

Pensem sobre isso sem ficar na defensiva. Ninguém quer banir o DOOM. Mas que mensagem é passada ao mundo sobre a comunidade de gamers?

Gamers vibrando intensamente com cenas de desmembramento brutal. Deus, isso é muito depressivo. Bem vindos à indústria dos jogos.”

Um interessante tema emerge desses tweets, é que embora Sarkeesian e McIntosh não sejam obviamente fãs da violência no jogo, não é exatamente isso que os chateia. O que os chateia é que a violência faz as pessoas vibrarem. Olhe para quantas referências são feitas a “vibrar” acima, e você verá.

Obviamente, humanos têm uma longa história de celebrar a violência (veja os duelos de gladiadores). Bizarramente, McIntosh parece ansioso para desviar sua crítica, devido ao tweet seguinte onde ele afirma que jogar um jogo e assistir a um filme são “fundamentalmente experiências diferentes”. Abstenha-se de pensar por enquanto no que isso se diferencia, pois voltaremos a isto. Vamos contextualizar a questão um pouco primeiro.

Desconforto com o Lado Sombrio da Natureza Humana

Nos vídeos de Sarkeesian (que é bem certo que McIntosh auxilia no roteiro), um dos mais interessantes (embora menos persuasivo) argumentos dela é que em jogos que possuem a opção de cometer violência contra mulheres implicitamente aprovam a violência contra a mulher. Como eu apontei em outra ocasião:

“De acordo com Sarkeesian, o problema real nesses cenários não é de os jogadores necessariamente terem de tomar uma parte neles. É de os programadores os terem feitos em primeiro lugar. […]

Sarkeesian quer ver um mundo onde a natureza humana é artificialmente mutilada para que certas formas de violência sejam tão inaceitáveis quanto literalmente impossíveis e inconcebíveis — onde certos impulsos nem mesmo metaforicamente são parte do comportamento humano. Mesmo se os personagens do jogo puderem sair por aí, assassinar pessoas e serem recompensados por isso, de acordo com a teoria dela, eles jamais deveriam ser autorizados a cometer violência sexual contra mulheres ou até mesmo a testemunhar isso porque o sistema patriarcal é tão opressor que os jogadores consequentemente irão internalizar a ideia de que isso é [socialmente] permitido.”

O problema aqui, como o Arquiteto de “Matrix” diria, é a escolha, não a violência. Isso nos dá um fascinante insight para o que incomoda McIntosh, Sarkeesian e seus comparsas quando pessoas vibram com a violência em “Doom”. O problema para eles não é que a violência foi retratada, como poderia ser em um filme. O problema para eles é dos outros quererem praticar aquela violência em um contexto simulado, e até mesmo considerar tal coisa como uma “diversão”! Claro, o próprio McIntosh não é fã de “jogos divertidos”, e ele disse isso, de forma reveladora:

“Na linguagem dos games, “diversão” é comumente um código para se sentir poderoso e sentir-se poderoso é um código para violentar pessoas e outros seres vivos.

Agora, nós poderíamos apenas dizer que McIntosh e Sarkeesian são provavelmente pacifistas enrustidos e deixar isso de lado. Mas na verdade, o que acontece aqui parece ser algo muito mais profundo, especialmente considerando que McIntosh admite abertamente querer instrumentalizar as narrativas que garantam a ele e a seus aliados o poder de mudar a cultura e modificar o comportamento humano, e os fatos que se danem. Portanto, o que parece na verdade ser um problema tem uma origem anterior ao caso de McIntosh e Sarkeesian, voltando para a introspecção do grande escritor tradicionalista Russel Kirk, e esse escreveu que o primeiro princípio dos radicais era (ênfase minha):

A perfectibilidade do homem e o ilimitável progresso da sociedade: meliorismo. Radicais acreditam que a educação, a legislação positiva e a alteração do ambiente podem produzir homens iguais a deuses — eles negam que a humanidade tem uma propensão natural para a violência e o pecado.

Uma propensão natural para a violência e pecado… digamos, o tipo de propensão que seria evidenciado ao se ovacionar exibições de desmembramento, e querer efetuá-los em um jogo de vídeo game?

Videogames providenciam uma válvula de escape para o mal

Um dos grandes cânones do discurso de esquerda desde à Revolução Francesa tem sido a ideia de que seres humanos podem ser “aperfeiçoados” ou, no mínimo, “melhorados” com o uso de força coerciva. A ideia, em outras palavras, de que pessoas são naturalmente boas e somente instituições como a propriedade e a tradição pode torná-las más. Conservadores, no entanto, nas palavras de George F. Will, tem sempre feito de sua missão “proteger você da crença esquerdista de que o ser humano é moldável”.

Se o trailer de “Doom” demonstra algo, é a evidência de que pessoas não se importam de serem influenciáveis, e de fato enaltecem coisas que os dão a saída segura para as suas tendências mais vis, do que tentar destruí-las. Além do mais, já que o jogo explicitamente coloca o jogador contra demônios sugere que jogadores preferem ver sua maldade ser direcionada para o heroísmo, e na verdade as mais antigas virtudes heróicas como um meio de compensar o impulso para a violência. O trailer de “Doom”, em suma, busca fazer as pazes com a propensão humana para a violência mesmo que a transforme em um pecado, do que tentar apagá-las. Pelos seus esforços, “Doom” é festejado. E com boa razão. Como seu predecessor “Hatred”, é apenas um jogo humanista.

Para os ideólogos da esquerda como Sarkeesian e McIntosh, o jogo é um lembrete de a ideologia esquerdista estar apartada da natureza humana, e que sua visão utópica de um mundo sem impulsos para a violência será sempre massacrada pela realidade antes de ser afogada em uma tempestade de um tiroteio humanista implacável.

Fontes e mais matérias

Informações adicionais

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