Celton é o super-herói que protagoniza a HQ de mesmo nome, legitimamente belo-horizontina, 200% independente e criada, escrita, publicada, ilustrada, colorida, editada e vendida pelo Lacarmélio Alfeo de Araújo.
Conheça a história do Celton, um simples mecânico que, apesar de sua força física e velocidade formidáveis, evita confusões e procura resolver os diversos problemas em cenários típicos da capital mineira ou que envolvem parte do folclore desta cidade.
Trata-se do super-herói que protagoniza a HQ legitimamente belo-horizontina de mesmo nome e 200% independente, criada, escrita, editada, publicada, ilustrada, colorida, estocada e vendida (nas ruas) por Lacarmélio Alfeo de Araújo.
Quem é de Belo Horizonte ou mora nela há algum tempo, já deve ter visto um sujeito, às vezes com um terno amarelo, em alguns sinais vermelhos segurando uma placa onde pode estar escrito algo como: “Vendo revistas em quadrinhos que eu mesmo fiz“, numa correria danada. Pois bem, ele é o Lacarmélio.
Resolvi fazer um episódio do Memorabília, uma série de vídeos do nosso canal onde eu gravo e mostro itens físicos interessantes mais ou menos relacionados à Gaming Room, sobre Celton e o seu criador:
Lacarmélio, que acabou ficando conhecido também como Celton, o nome do seu mais famoso personagem, é de Inhapim, região leste de Minas. Diz ele que já tinha paixão pelos quadrinhos desde pequeno e morava em Itabirinha de Mantena (roça purinha, mais que BH), quando a família decidiu se mudar para a capital.
Exerceu desde cedo (e isto é absolutamente correto) profissões como vendedor de rua e engraxate, e isto lhe garantiu experiências determinantes para o que o futuro lhe reservara, pois, além da produção independente, Lacarmélio teve que recorrer aos malditos engarrafamentos de Belo Horizonte para vender suas revistas, e isto deu certo.
Não vou mentir. Fiquei conhecendo o trabalho deste quadrinista de rua por mera curiosidade e não percebi a qualidade logo de cara. Era fim dos anos 90, uma época onde as coisa tendiam a ser extravagantes, rebeldes e sombrias, e isto refletia na produção de quadrinhos (Marvel, DC, Image etc.), com os quais eu, ainda adolescente, estava acostumado. O enredo leve, quase ingênuo, e o estilo modesto me deixaram com a impressão de que era apenas uma excentricidade de algum sujeito peculiar, ou algo do tipo.
Além disto, os roteiros da revistas são desenvolvidos dividindo a ação entre todos os personagens, com muitas vezes o herói nem tendo muito destaque, dando-se prioridade ao conjunto. Entretanto, foi questão de tempo até começar a apreciar o traço despretensioso e divertir com as histórias que envolvem lendas, pontos e elementos típicos da cidade.
E não parou por aí: acontece que Celton não se resume apenas às cinco revistas que me sobraram (as outras sumiram). A HQ foi criada em 1975, com a primeira entrevista publicada em 1981, o que significa que o cara tá tá na luta há décadas. Depois de ter sido rejeitado pelas editoras, apostar na produção independente, de algumas paradas pontuais e uma viagem aos EUA feita para descolar uma graninha, ele deu uma parada total por dificuldades financeiras em 1992. Entretanto, em 1998, Lacarmélio não aguentou e retornou com a revista, reformulada em produção e temática e agora focada no Brasil, trazendo o protagonista com um novo e mais original estilo, fugindo do esquema Marvel e DC.
Dentre as mudanças, Celton também ficou sendo morador de Belo Horizonte, mas é interessante que isto não impediu de vender suas revistas em outras cidades brasileiras. E a HQ permanece assim até hoje, pois encontrei com o Lacarmélio outro dia num sinal de trânsito e ele tava lá na batalha, embora pareça estar lançando apenas reedições dos clássicos, por hora.
É interessante também contar também como o Celton acabou ramificando em várias outras atividades mais ou menos lucrativas para o Lacarmélio. Das quatro revistas que tenho aqui, duas são do Celton mesmo, uma é natalina, contando a história do Nascimento de Nosso Senhor, e outra é do Tambaciri, um herói indígena brasileiro da era colonial. Lembro também de um CD onde tudo era ele quem fez: produção, design, gravação, composição, interpretação etc.
Além disso, a fama abriu as portas para vários outros trabalhos relacionados à ilustração, sem contar os anunciantes na revista que deviam ajudar com um bom cascalho.
Hoje, Lacarmélio diz que consegue viver bem, mesmo que aos trancos e barrancos, só com o Celton, e isto significa todas estas atividades “spin offs” dele. Não sei dizer o quanto ele ainda depende de trabalhos para terceiros, entretanto. Creio que a internet deve ajudar ele a vender mais atualmente, sei lá.
Enfim, a revista tem seu charme próprio e a sua trajetória, que se confunde com grande parte da biografia do próprio Lacarmélio, formam um conjunto extraordinário. A idéia de um sujeito que conseguiu fazer seu nome com um trabalho totalmente fora do mainstream, sem se ater a modismos nem ideologias, e dependendo praticamente só dele é inspiradora para os artistas independentes de todas as áreas, inclusive na dos videogames.
Por todas estas razões, eu declaro o Lacarmélio patrimônio cultural e histórico de Belo Horizonte.
Como acontece frequentemente com os super heróis, a origem do Celton já foi retroativamente alterada. Ele já foi cientista e até se chamou Homem-Felino, mas, hoje, ele é o seguinte:
Atacado por uma doença incurável, Celton estava irremediavelmente condenado à morte, quando, como única esperança, foi exposto aos raios de um brilhante meteoro que acabara de cair do espaço. Isto não o curou, como era esperado pelo cientista que conduzia os experimentos, mas piorou seu estado de saúde, acelerando os malefícios da doença.
Nos seus últimos instantes de vida, nos espasmos da morte, Celton foi picado por jararacas, cujo veneno reagiu quimicamente com a doença incurável e os efeitos da exposição aos raios do meteoro desconhecido. Cada uma destas coisas, separadamente, era mortal, mas a combinação de todas curou Celton totalmente, e ainda lhe garantiu força e agilidade extraordinárias.
Como ser humano, Celton é, no mais simples que se possa definir, bondoso e pacato. Trabalha de mecânico na companhia de seus melhores amigos, Paulo e Beto. Sua namorada é a Cida, de temperamento carismático e explosivo.
Em 19 de fevereiro de 2022, descobri uma entrevista mais recente do Lacarmérlio, a qual foi cedida ao canal O Segredo do Meu Sucesso. Ele conversou sobre a sua trajetória nas artes e seu processo criativo.
Acima, tem a playlist com mais vídeos a respeito de Celton e do Lacarmélio que citei no Memorabília 6. Tem boas entrevistas com ele aí.
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